terça-feira, 23 de abril de 2013

"Em algum momento, em vários deles ou definitivamente, as pessoas sempre vão embora. Talvez essa seja a pior coisa do mundo. Ele vai embora, sempre, quando eu preciso de quinze minutos de silêncio complementar à minha entrega, odeio o desespero dele por banhos e a sua ansiedade curiosa pelo que vem depois. Que se dane o depois, eu sou agora, ou pelo menos era.
Ele vai embora, sempre, quando o parágrafo passa de três linhas, o pensamento dele ultrapassa meus olhos, o som se perde da minha boca para qualquer outro canto do mundo que não tenha seus ouvidos e ele olha fixamente para qualquer outra coisa que não seja a minha existência. Sempre a mesma cara de tédio e de busca pelo resto que não se repete ou não se prolonga. Ele sempre vai embora quando eu queria que ele se perdesse um pouco, rasgasse a agenda, lançasse o celular no rio, desligasse todos os toques, luzes e sinais de que há todo o resto. Esquecesse do sono, do livro, da planta, das lembranças. Ele sempre vai embora do meu mundo quando eu só queria que ele descansasse um pouco de ser ele o tempo todo, mas ele tem muito medo de não ser ele, talvez porque ele não saiba o que ele é.
Ele sempre vai embora pra descobrir quem ele é, ou para lembrar que ele é o mesmo de sempre que não sabe quem é, ele sempre vai embora antes da gente ser alguma coisa juntos. Vivo com essa sensação de abandono, de falta, de pouco, de metade. Eu não sei deixar partir, eu não sei escolher, excluir, deletar."

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